segunda-feira, 20 de abril de 2009

O Brasil, Portugal e a CPLP

Cecil Beaton, Terreiro do Paço, 1942


Lemos com um misto de agradável surpresa e algum desalento as declarações de Luís Alberto Moniz Bandeira, este fim-de-semana, ao Expresso. Surpresa por vermos um politólogo brasileiro defender dever Portugal estabelecer «uma aliança estratégica» com o Brasil «à semelhança, aliás, do que a França está a fazer». Desalento por, uma vez mais, nos vermos estar a ser ultrapassados por terceiros com uma perfeita e quase absoluta inacção política por parte de Portugal, por parte de quem Governa Portugal.



Extraordinárias e certeiras são também as suas declarações sobre o «retrocesso» nas relações luso-brasileiras após o ingresso de Portugal na Comunidade Económica Europeia, tendo então acabado o acordo de equivalência, lembrando ainda: mais «Portugal esqueceu-se do Brasil e este, por outro lado, virou-se para a América do Sul».

De tão exactas e terríveis, as palavras de Moniz Bandeira ferem como um punhal de aço perante a passividade de Portugal frente ao Brasil que, afirma ainda, «não vê os portugueses como estrangeiros».

Na verdade, no documento de Política de Defesa Nacional do Brasil, afirma-se, claramente:

«3 - Entre os processos que contribuem para reduzir a possibilidade de conflitos no entorno estratégico, destacam-se: o fortalecimento do processo de integração, a partir do Mercosul, da Comunidade Andina de Nações e da Comunidade Sul-Americana de Nações; o estreito relacionamento entre os países amazônicos, no âmbito da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica; a intensificação da cooperação e do comércio com países africanos, facilitada pelos laços étnicos e culturais; e a consolidação da Zona de Paz e de Cooperação do Atlântico Sul.»

«3.6 - Como consequência de sua situação geopolítica, é importante para o Brasil que se aprofunde o processo de desenvolvimento integrado e harmônico da América do Sul, o que se estende, naturalmente, à área de defesa e segurança regionais.»


«4.9 - O Brasil atribui prioridade aos países da América do Sul e da África, em especial aos da África Austral e aos de língua portuguesa, buscando aprofundar seus laços com esses países.»

«4.10 - A intensificação da cooperação com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), integrada por oito países distribuídos por quatro continentes e unidos pelos denominadores comuns da história, da cultura e da língua, constitui outro factor relevante das nossas relações exteriores.»

Como será de meridiana evidência, neste momento, a existência e consequente acção da CPLP tem uma importância estratégica para Portugal que não possui para o Brasil. Não obstante, na sua Política de Defesa Nacional, a CPLP surge ainda como um dos factores relevantes das suas relações externas. E nós, portugueses, pouco ou quase nada fazemos para aproveitarmos e incentivarmos essa linha e oportunidade estratégica única.

Ridículo, tão ridículo como ser ainda Moniz Bandeira a lembrar-nos esta simples evidência: «Se Portugal nada fizer para manter a sua identidade lusitana, dentro de algumas décadas pode diluir-se em Espanha, que tem muitos mais recursos e uma política cultural muito agressiva»

Como já aqui se escreveu, se não atendermos às nossas verdadeiras prioridades, CPLP-NATO-EU, em vez do disparate da actual hierarquia, EU-NATO-CPLP, um dia ainda veremos as palavras de Moniz Bandeira tornarem-se simples e tristemete proféticas.

Na verdade, temos muito a aprender com o Brasil e os brasileiros. Uma vez mais, o que precisamos é deixarmos de nos comportarmos como patetas.

Gostava que fosse ainda época de usar chapéu para o tirar, com a devida vénia,a Luís Moniz Bandeira que, em meia dúzia de parágrafos, nos dá uma verdadeira lição do possível e verdadeiro sentido estratégico da política, uma verdadeira lição de entendimento do verdadeiro sentido estratégico das nações.


E o mais, por agora, é apenas silenciarmo-nos e meditarmos, recolhidamente, no fundo ou alto significado das suas palavras

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