domingo, 1 de novembro de 2009

Ainda os Submarinos



As recentes palavras do muito ilustrado e douto Almeida Santos sobre a suposta inutilidade e desperdício financeiro dos submarinos portugueses, revelam não apenas a mais profunda inconsciência geopolítica da grande maioria dos nossos actuais governantes mas também, e ainda mais gravemente, o seu criminoso desprezo pela defesa dos designados interesses nacionais permanentes.

Não por acaso, quando hoje se fala de interesse nacional, seja na Defesa, seja na Agricultura ou seja no que for, uma significativa maioria dos nossos governantes, senão a sua quase totalidade, logo afirma, num sorriso largo, com tanto de complacente quanto de sobranceria, devermos tudo enquadrar primordialmente no quadro da União Europeia, na qual nos encontramos inseridos, o que não pode deixar de significar também a plena abdicação da prossecução própria dos nossos verdadeiros e singulares interesses para subsumirmos o nosso destino nos compreensíveis desígnios dessa mesma União Europeia onde Portugal, não sem surpresa, conta pouco se é que alguma coisa chega a contar.

Não por acaso, as patéticas afirmações do muito ilustrado e douto Almeida Santos surgem num momento em que se confunde a importância da aquisição dos submarinos para Portugal com os vários imbróglios relativos à designada política das contrapartidas, confundindo capciosamente ambos os planos como se os mesmos se interligassem linearmente e os problemas relativos a estas anulassem, de per si, tudo o mais.

Como já aqui foi diversamente referido, basta saber olhar para um mapa de Portugal para perceber a crucial importância para nós da aquisição da nova frota de submarinos, inicialmente planeada inclusive para três e não apenas para dois, por motivos de planeamento operacional. Todavia, deixando esta questão para os especialistas, independentemente do seu número, as razões porque se atribui crucial importância à aquisição dos submarinos são fáceis de compreender.

O território nacional subdivide-se, neste momento, numa área emersa de cerca de 92.391Km2, e uma parte imersa cerca de 18 vezes superior, podendo, com o actual projecto de Extensão da Plataforma Continental, de chegar mesmo a cerca de 3 milhões de Km2, o que não pode deixar de significar senão, no caso de Portugal, de uma acentuada preponderância do espaço marítimo sobre o espaço terrestre, se assim podemos dizer.

Para além disso, como também se sabe e aqui já foi referido, tendo Portugal ainda uma extensa área de Busca e Salvamento, a designada área SAR, compreendendo uma área 62,7 vezes a área terrestre, cometida ao seu comando, com facilidade se infere a importância de se possuírem os meios necessários ao cumprimento das missões correlatas, não deixando os submarinos, nesse âmbito, de exercerem um papel preponderante, seja em termos de vigilância, de projecção de força, dissuasão e efectiva defesa dessas vastas áreas marítimas.

A inconsciência geopolítica e geoestratégica da grande maioria dos nossos governantes, para não designar mesmo como criminosa cegueira, quando olhamos para Espanha e verificamos dispor a sua Armada, para além de um Porta-aviões como o Príncipe das Astúrias, outro como o Dédalo, uma frota de quatro submarinos em pleno exercício e mais quatro, modernos e altamente sofisticados, em construção em Cartagena e equivalentes aos nossos actuais submarinos do tipo U-214, para além de todo outro tipo de navios de superfície, desde contratorpedeiros às mais diversas fragatas, navios anfíbios, aviões a helicópteros e demais material que permitem à nação vizinha afirmar-se tanto no Mediterrâneo como no Atlântico.

Mas mais do que isso, importa perceber os interesses de Espanha no nosso espaço marítimo e de interesse estratégico, tal como se tem vindo a afirmar ao longo dos últimos anos, não apenas com o beneplácito mas até como o aplauso, activo incentivo e explícito apoio da União Europeia presidida pelo não menos ilustre e igualmente ilustrado e muito douto José Manuel Durão Barroso.

Referimo-nos, como é evidente, não apenas à nossa ZEE, área SAR e futura Extensão da Plataforma Continental, mas inclusive todas as zonas marítimas que incluem desde os mares dos Açores e da Madeira, até à nossa costa continental e a costa de Marrocos e Africana, até Cabo Verde, entendendo já este arquipélago como uma quase extensão natural das Canárias, não sendo estranho a tudo isto a difícil discussão de negociação da permanência do Comando da NATO em Oeiras, conseguida, apesar de tudo, in extremis, a despeito de todas as legítimas mas pouco simpáticas manobras espanholas que o queriam herdar a todo o transe.

Não nos iludamos, na vida real, na política real, a capacidade de força, conta sempre. Não contará exclusivamente, por certo, mas conta sempre e muito. E conta tanto mais quanto, neste momento, como já foi diversamente chamado à atenção, quando a Gestão dos Seres Vivos na coluna de água na nossa ZEE, por virtude do Tratado Constitucional Europeu, agora travestido de Tratado de Lisboa, passa para a Comissão Europeia, quando a preocupação da vigilância das Fronteiras Marítimas da mesma União Europeia assume primordial relevância, se não manifestarmos efectiva capacidade de defesa dos nossos interesses, do nosso mar, da nossa independência, Portugal passará rapidamente à irrelevância.

Por enquanto, com a aquisição dos novos submarinos, durante um pequeno período, Portugal terá ainda alguma vantagem comparativa em relação a Espanha, dispondo de equipamento e tecnologia que os espanhóis só terão disponível a partir de 2011, com a entrega do primeiro dos quatro submarinos de nova geração em construção em Cartagena, estando também planeada a entrega de um outro em 2012 e dos restantes dois 2014.

A manter-se a actual inconsciência geopolítica e geoestratégica de grande parte dos nossos governantes, mesmo projectos como o extraordinário projecto que representa a Extensão da Plataforma Continental, só irá beneficiar terceiros e, por maioria de razão, Portugal será lentamente reduzido a uma pura insignificância, seja em termos da União Europeia, NATO, ou seja o que for, incluindo mesmo a sempre tão nossa mas também tão longínqua que por vezes se dirá mesmo quimérica CPLP.



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