Vasco Pulido Valente, na sua crónica de ontem, no Público, Sábado, 10 de Abril do ano da Graça de 2009, afirma constituir uma saloiice o apoio de Portugal à NATO na guerra do Afeganistão. Valerá a penas transcrevermos o final do texto para evitar dúvidas ou mal-entendidos: «Pensa o dr. Nuno Severiano Teixeira, e pensa evidentemente José Sócrates, que colaborar nesta fantasia (e, de caminho, entregar o Paquistão ao radicalismo islâmico) é a melhor maneira de garantir a influência de Portugal na NATO. Aqui de novo, como com Barroso, a saloiice indígena arrasa o mais leve vestígio de bom senso. A cumplicidade no erro parece uma credencial e seguir Obama um sinal de maioridade. Coisa triste.»
A crónica de Pulido Valente tem como pretexto um artigo de opinião publicado igualmente no jornal Público, no dia anterior, Sexta-feira, pelo Ministro Severiano Teixeira, defendendo e enaltecendo, em síntese, a posição afirmada pelo Primeiro Ministro, em nome de Portugal, na Cimeira da NATO, de reforço da nossa posição em meios humanos na ISAF, ou seja, no teatro de guerra do Afeganistão.
O texto do Ministro, sendo de circunstância, não é brilhante mas cumpre o seu intuito que não é senão o de reforçar, agora em nome do Ministério da Defesa e do próprio Ministro, a posição de Portugal assumida na Cimeira da NATO, tanto mais quanto, sendo formalmente o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, o Chefe Supremo das Forças Armadas, a si cumpre a decisão última sobre a efectiva concretização dessa mesma posição assumida por Portugal na Cimeira da NATO.
Entende Vasco Pulido Valente constituir a posição de Portugal um erro porque, se bem entendemos: 1) o Afeganistão é longe; 2) sendo longe, nada tem a ver connosco; 3) não tendo Portugal a capacidade de projecção de força de outras nações europeias, para já não falar nos Estados Unidos, a sua participação e contribuição será sempre exígua e, possivelmente, na sua visão, ridícula; 4) a guerra do Afeganistão estará perdida e, por consequência, tudo quanto se faça, será sempre esforço inglório e em vão.
De permeio, introduz Pulido Valente uma habilidade pouco digna da sua estirpe de analista, como se o reforço da guerra no Afeganistão tivesse como implicação necessária, intencional ou não, de entregar o Paquistão ao radicalismo islamista.
Como qualquer pessoa medianamente informada sabe, e bastará ler os artigos que o General Loureiro dos Santos tem publicado no mesmo Público para o saber, o êxito no Afeganistão está intrinsecamente ligado ao sucesso de pacificação no Paquistão. Porém, são questões, enquadramentos e âmbitos políticos completamente distintos e como tal devem ser abordados e tratados. O mandato da NATO respeita ao Afeganistão e não ao Paquistão. Misturar ambas as questões com a ligeireza que Pulido Valente faz, releva pouca reflexão, admitindo que são seja pior, desonestidade intelectual.
O Afeganistão é longe? É. Não temos nada a ver com o Afeganistão? Temos, quanto mais não seja por pertencermos à NATO e também porque, como membros da União Europeia, parte do Ocidente, não podemos deixar de estar empenhados na defesa contra o terrorismo como, acima de tudo, foi, e é, a guerra do Afeganistão. Nem tudo correu bem, muitas das estratégias seguidas foram inadequadas, terá mesmo sido um erro a invasão? Tudo isso é admissível mas o facto é que, hoje, as circunstâncias são o que são e é a partir do ponto em que nos encontramos que importa decidir. Fazer de menino birrento e dizer que assim não brinca, não conduz a nada.
Entende Vasco Pulido Valente que Portugal se deve retirar da NATO? Entende Vasco Pulido Valente que devemo-nos remeter, orgulhosamente sós, à nossa paróquia, procurando viver tão habitualmente quanto possível, renegando em definitivo as maçadas do mundo?
Portugal não tem a capacidade de projecção de força de outras nações europeias e muito menos dos Estados Unidos. É uma evidência. Todavia, na devida proporção, o contributo de Portugal não tem deixado de ser louvado por duas razões principais: 1) a qualidade dos efectivos; 2) a disposição de estarem de corpo inteiro, sem as restrições, os designados caveats, na gíria, tal como sucede, por exemplo, com as tropas alemãs. É pouco? Será, mas é a medida do possível.
O apoio de Portugal à ISAF não garante, de per si, a influência de Portugal na NATO? Talvez não, quem somos nós para o afirmar. Não obstante, qual poderia ser, qual seria, o papel e influência de Portugal da NATO quando, eximindo-se às suas obrigações e responsabilidades na Aliança, recusasse o apoio e reforço à ISAF?
Para Vasco Pulido Valente, não sendo Portugal Inglaterra, sem uma Oxford que o mereça, Portugal que nunca fez nada digno de registo ou outros não fizessem multiplicado por cem, não passa de um lugar inóspito, cheio de pacóvios a armar ao pingarelho que se vai aturando, terrível e confrangedoramente, por imposição do destino. Faça Portugal o que fizer, façam os portugueses o que fizerem, mais valera nada fazerem porque, isso mesmo, ou o seu contrário, será sempre um erro, um disparate, uma inanidade.
Coisa triste. Muito triste, este atavismo, também.
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