sexta-feira, 24 de abril de 2009

Dos Estaleiros de Viana do Castelo

Josef Kudelka - Portugal, 2005

O Expresso do passo fim-de-semana, dava notícia do Instituto dos Transportes Marítimos ter chumbado os desenhos e o projecto técnico do segundo ferry que o Governo dos Açores tinha encomendado aos Estaleiros de Viana do Castelo.

Os problemas com o primeiro ferry foram já amplamente noticiados, tendo a sua entrega sido recusada por não atingir as velocidades mínimas que o contrato consideraria ou considerará aceitáveis.


No caso do segundo ferry, a questão parece estar ligada, segundo o Expresso, a alterações propostas ao projecto inicial não conformes às normas de segurança da Convenção Solas (Safety of Life at Sea).

Todas estas notícias são, por um lado, intrigantes e, por outro, deveras preocupantes.

São, antes de mais, intrigantes porque, tanto quanto é dado saber ou consta, afigura-se que o projecto dos ferry não é nacional mas Russo, tendo sido desenvolvido por uma empresa de S. Petersburgo. A ser assim, o opróbrio que hoje recai sobre a engenharia náutica portuguesa poderá estar salvaguardada mas, para isso suceder, importa esclarecer, de facto, sem equívocos, de quem a efectiva autoria dos projectos.

Todavia, o que também é facto é que, entretanto, é o nome, a reputação e o prestígio dos Estaleiros de Viana do Castelo que hoje estão a ser colocados em causa.

Portugal já não tem uma verdadeira frota de transportes marítimos por ter sido explicitamente decidido e aceite tal não ter sentido. Portugal corre agora o risco de ficar também sem qualquer Estaleiro de Construção Naval digno desse nome.

Os Estaleiros de Viana do Castelo são uma espécie de último reduto depois de estaleiros como os Estaleiros da Figueira da Foz terem sido vendidos a espanhóis para construção, tanto quanto se sabe, de pás de hélice para as torres eólicas.

Ainda segundo a notícia do Expresso, o Ministro da Defesa terá dado orientações ao presidente do Conselho de Administração da Empordef, empresa mãe das empresas de defesa do Estado, entre as quais se encontram os Estaleiros de Viana do Castelo. Para o Ministro da Defesa, adianta igualmente o Expresso, esta é, porém, «uma questão empresarial que deve permanecer nesse plano».

Não se entende exactamente o que se pretende dizer com tal afirmação. A questão não é meramente empresarial porquanto é, pode, ou deve ser vista, essencialmente, como uma questão estratégica para Portugal e os Estaleiros de Viana do Castelo não são uma mera empresa particular onde o Estado não tem responsabilidade alguma. Ou seja, nunca podrá ser uma mera questão empresarial, é, será sempre, antes de mais e acima de tudo, uma questão política, no sentido mais elevado da expressão.

Sabe-se como a construção naval é uma das áreas de crescente de determinante importância e, por consequência, de crescente e feroz competitividade, tanto em termos militares como civis.

Para ficarmos próximos de nós, basta pensar no Juan Carlos I, um dos navios anfíbios tecnologicamente mais avançados da actualidade, acabado de construir aqui ao lado, em Espanha, pela Navantia, constituindo-se também como o maior navio anfíbio LHD (Landing Helicopter Docks) alguma vez construído na Europa.

Juan Carlos I (DTI)

Entretanto, nós, parece, estamos reduzidos a isto, ou começamos a estar reduzidos a isto, i.e., a não termos sequer capacidade para construirmos um simples ferry…

Não se afiguram necessários mais comentários.


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